É O BICHO

Encontrei o cão que você abandonou

Hoje encontrei seu cão. Não, ele não foi adotado por ninguém. Aqui por perto, a maioria das pessoas já têm vários cães; aqueles que não têm nenhum não querem um cão. Eu sei que você esperava que ele encontrasse um bom lar quando o deixou aqui, mas ele não encontrou. Quando o vi pela primeira vez, ele estava bem longe da casa mais próxima e estava sozinho, com sede, magro e mancava por causa de um machucado devido ao cansaço físico.
Eu queria tanto ser você naquele momento em que parei na
frente dele. Para ver sua cauda abanando e seus olhos brilhando ao pular nos seus braços, pois ele sabia que você o encontraria, sabia que você não esqueceria dele. Para ver o perdão em seus olhos pelo sofrimento e pela dor por que ele havia passado em sua jornada sem fim à sua procura… Mas eu não era você. E, apesar das minhas tentativas de convencê-lo a se aproximar, seus olhos viam um estranho. Ele não confiava em mim. Ele não se aproximava.
Ele virou as costas e seguiu seu caminho, pois tinha certeza de que esse caminho o levaria a você. Ele não entende que você não está procurando por ele. Ele só sabe que você não está lá, sabe apenas que precisa te encontrar. Isso é mais importante do que comida, água ou o estranho que pode lhe dar essas coisas.
Percebi que seria inútil tentar persuadi-lo ou segui-lo. Eu nem sei seu nome. Fui para casa, enchi um balde d’água e uma vasilha de comida e voltei para o lugar onde o havia encontrado. Não havia nem sinal dele, mas deixei a água e a comida debaixo da árvore onde ele havia buscado abrigo do sol e um pouco de descanso. Veja bem, ele não é um cão selvagem. Ao domesticá-lo, você tirou dele o instinto de sobrevivência nas ruas. Ele só sabe que precisa caminhar o dia todo. Ele não sabe que o sol e o calor podem custar-lhe a vida. Ele só sabe que precisa encontrá-lo.
Fiquei preocupada. Você deve saber que poucas pessoas tentariam ajudar seu cão e o desfecho deste tipo de abandono nem sempre é bom.
Com o coração apertado sai andando á procura do seu cão e ao encontrá-lo bem longe do local que deixei a água e a ração, a sede não o atormentava mais. Sua fome havia desaparecido e suas dores haviam passado. O cansaço na sua procura não o incomodava mais. Agora seu cão está livre de todo esse sofrimento. Seu cão morreu.
Ajoelhei-me ao lado dele e amaldiçoei você por não estar aqui ontem para que eu pudesse ver o brilho, por um instante sequer, naqueles olhos vazios. Rezei, pedindo que sua jornada o tenha levado àquele lugar que acho que você esperava que ele encontrasse. Se você soubesse por quanta coisa ele passou para chegar lá… E eu sofro, pois sei que, se ele acordasse agora, e se eu fosse você, seus olhos brilhariam ao reconhecê-lo, ele abanaria sua cauda, perdoando-o por tê-lo abandonado.

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